terça-feira, 5 de abril de 2011

Puta

    Ontem eu conheci uma puta, era cêdo e ela estava parada numa barraca de feira, cheirando uma fruta na mão. Estava tão entregue em seu momento que não viu que eu me aproximava, ela me atraía como a um imã. Tinha os cabelos presos, um vestido longo e carregava umas flores amarelas na sacola e outra bem acima da orelha. 
    As pessoas a olhavam mas ela não às enxergava. Escolhia calmamente, foi quando eu a ouvi perguntar ao feirante de onde vinham aquelas frutas, quando o silêncio foi quebrado aproveitei para me aproximar, acho que acabei por invadir seu território, pois ela me olhou, carregava força e tristesa em seus olhos negros.
    Sem graça eu sorri e ela levantando levemente a cabeça aspirou fundo, como um animal procurando o cheiro do outro. Me senti uma caça e abaixei o olhar, ela ajeitou a flor que escorregava nos cabelos, pagou ao feirante e ao abaixar para pegar a sacola me perguntou:
    -Jantas comigo?
    Tentei controlar o pulsar alto do meu coração, com mêdo que ela ouvisse e enxergasse que eu não passava de uma presa totalmente entregue, respirei fundo e respondi:
    -Sim.
    Ela sorriu sem abrir a boca e com os olhos apertados, parecia conversar consigo, depois me entregou um bilhete, que não tive coragem de abrir na hora e falou:
    -Oito e meia. 
    Fiquei mudo e ela se foi, abri o bilhete e vi o endereço. O que aconteceu até o horário marcado foi a ansiedade do encontro. A casa era pequena e isolada, bati na porta e ela abriu. Parecia outra pessoa totalmente a vontade em seu território. uma saia branca até os joelhos, uma blusa vermelha e outra flor nos cabelos ( Comecei a achar que aquelas flores brotavam de suas orelhas e as cores variavam de acordo com o momento).
    Depois que ela se virou pude observar o ambiente, era pequeno, colorido, quente, cheiroso, quase não tinha móveis, um rádio, não vi TV, só observei que tinha muitas plantas (talvez isso explicasse as flores).
    Pediu para que eu me sentasse, puxou a cadeira e eu me ajeitei nervoso, com os braços apoiados na mesa de madeira com quatro cadeiras. Ela voltou da cozinha com um copo e perguntou se eu bebia alguma coisa, respondi que sim. Após me servir voltou com uma vasilha cheia de água e com algumas batatas dentro. Eu achava que o jantar já estivesse pronto e que iríamos direto nos embriagar no desejo de sexo, mas me enganei. Ela me deu uma faca e uma batata e sem dizer uma palavra, se sentou a minha frente, pegou outra faca e começou a descascar sem ao menos me olhar.
    Ali comecei a descascar também, todo preconceito em relação a ela. Disse que não tinha ninguém, mas que sempre teve a si mesma, disse que se apaixonou várias vezes mas que amou apenas uma vez e foi a única vez que se sentiu fragilizada e pensou em abandonar sua vida. Disse que o mais importante para ela  era a liberdade e por isso não queria nada que a prendesse, nem filhos, nem marido e nem família.
    Disse que preferia comer feijão comprado com seu próprio dinheiro, do que lagosta sendo obrigada a chupar quando não queria. Disse que era puta por prazer e que gostava de ver nos olhos dos homens a entrega.
    Disse que não era uma mulher comum e que não se venderia a um homem só, em troca de casa, viagens, jóias ou qualquer outro luxo. Admirava a dignidade e que o pouco que tinha, fora conseguido por trabalho pago por serviços prestados. Acreditava no destino, no livre arbítrio e na vida.
    Falou tudo isso, enquanto preparava uma das melhores comidas que já comi nessa minha vida, depois me farejou, me beijou, me amou e nada cobrou.

                                                                                    Augusto

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